domingo, 11 de julho de 2010

sabe, mãe...

Hoje, essa sua loucura me doeu como há muito não doía. Hoje, as tuas palavras, esquizofrênicas, me tapearam a face como há muito não faziam. O peso delas pousou em meu olhar e, triste - o olhar -, ficou a relê-las como se fossem inéditas. Depois reteu-as e lá descansaram, na garganta, como mil nós. Sabe, mãe, há muito realmente eu não sentia meu corpo definhar por tua causa, há muito sinto-me anestesiada diante destas circunstâncias, tava vivendo a vida leve, como que tivesse esquecido, como que tivesse superado. Mas aí, nessa tarde de domingo, sentada no meu sofá deste mesmo domingo e de ressacas de dias sortidos, flagrei-me a lutar contra aquele áspero peso da tristeza, que desceu, apertou o peito e, juntamente com tuas palavras, 'borboletaram' pelo meu estômago. Ai, mãe, eu não sei o que fazer! E mal posso reclamar isso a ti... sabe!? Vejo você flutuar nessa sua realidade inventada, realidade de mesclas de passados, pessoas, fantasias... dá uma vontade de te sacudir, dá uma vontade de fazer-te acordar desse sonho! Tenho tanto medo do seu sofrer, tanto medo do desgaste do teu oscilante emocional que cambaleia por entre opostos em intervalos de tempo tão pequenos...! E eu fico aqui, a fazer nada, PN, niente! Sabendo que, mesmo que eu tentasse, diferença não faria. Pois isso é muito teu, é muito interno.. é tão abstrato, intangível... Acho que a psicologia me atraía por isso, sabia? Acho que eu achava que seria eu quem iria te desvendar de vez e diagnosticar esses teus devaneios... Mas, de tanto doer, desisti, larguei de mão, fui evadir-me nas artes, nas letras... achei meu modo de extravasar nas cores, na História, nos pré-socráticos, em Sartre. E fiz deles as minhas paixões, fiz de você a minha condição eterna, o meu aprendizado, a dor que ensina. Fiz dessa tua condição o roteiro de um filme: um daqueles cults de câmeras confusas, despedidas e muitos cigarros. Mas... poéticos!, profundamente poéticos e humanos! Fiz de ti Meu amor incondicional. Sei que em algum lugar, no filtrado das minhas lembranças, há alguma amargura em relação a essa coisa toda, mas simplesmente não tenho raiva. Esse amor não tá nem aí pra isso, aliás, ele é feito disso, dessas porradas que só o fazem maior, só o fazem mais forte. Sei lá, viu, mãe... você foi sempre meu maior paradoxo, dor e encanto numa pessoa só. Quando eu era pimpolha eu não sabia lidar, agora, modéstia à parte, fiquei super dez, craque, muito excrota mesmo na questão de conviver com esse fato, e eu tou bem, mãezinha! Se você soubesse o quanto eu aprendi! Mas.. é só que, vez em quando, nesses domingos silenciosos, nesses dias em que me afogo no edredom o dia inteiro, sei lá, quando você me vem com suas doiduras, sabe, me alembro de que, não há tempo que torne esse filme num filme feliz. Mas talvez haja vida, haja mudança que te dê um final tranquilo, que apenas frize a humanidade e a poesia que há em ti, que há na vida que lhe foi dada, mesmo ela sendo feita de coisas tão loucas, de altos tão altos e baixos tãos doídos. E é isso mesmo que eu desejo, muita paz..

2 comentários:

  1. bonito e sincero desabafo...
    mãe é mãe morando aqui ou na lua, mas a gente sente ela é na pele. oh confusão!

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  2. Manu! Que texto forte... Eu fiquei querendo comentar, mas fiquei com receio. Foi muito, muito duro, mas muito vivo e isso mexeu aqui.

    Uma das coisas que me falaram logo no comecinho da Psi é que a partir de agora eu vou querer analisar tudo na minha mãe, que todos vamos querer fazer isso. E que, lá no final, a gente vai ver que é tudo culpa dela(s).
    Mas, lendo aqui, se for culpa dessa mãe que é seu amor incondicional toda essa sua humanidade, essa sua angústia traduzida em palavras, esse medo dolorido e cruel visto em um filme poético, esse encanto e essa sua força... Não há do que ter raiva mesmo. E o seu amor em paz e incondicional me parece a melhor forma de agradecer.
    Que humanidade linda, sempre, a sua...

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